Para entender a co relação entre violência sexual e homofobia conversamos no mês de Maio com Danielle Sanchez Mutaledi. Ela tem 30 anos e desde de adolescente acompanha e contribui com essas discussões. Mulher, negra, lésbica e candomblecista, Danielle é assistente social de formação e educadora popular. Ao longo de sua militância pelos direitos humanos ela afirma que todas as questões estão interligadas, pois somos sujeitos complexos com direitos indivisíveis, que não se separam. Ela foi ponto focal do Comitê Nacional de enfrentamento a violência sexual do DF e atualmente está como Secretária executiva do Conselho do Negro do Distrito Federal. Sua luta é buscar fazer essas inter conexões, conforme ela afirma, tudo está interligado e todas as questões interferem diretamente no desenvolvimento da criança e do adolescente. Confira baixo nossa conversa.
Campanha ANA: Danielle, quando você disse para si mesmo, tenho que lutar por essas causas! Qual foi o clique que te despertou para essa defesa?Danielle Sanchez Mutaledi: Como eu disse eu sempre trabalhei com a área da infância, em especial com a população em situação de rua. E a gente sempre recebia denuncia das meninas sobre violência sexual, por parte do poder público, em especial praticada pela polícia. Começamos a fazer o trabalho para preparar essas meninas para futuramente fazer essa denúncia, entendendo que elas estavam em situação de violência e de vulnerabilidade muito maior por estarem na rua e sempre se depararem com os agressores. Daí começamos a desenvolver alguns projetos para trabalhar essas questões. Foi quando me apaixonei pela temática e comecei a discutir. E eu sendo mulher vi que nós sofremos muito mais com o processo de violência. Então começamos enquanto educadores a perceber também os processos de violências que tínhamos vivenciado ao longo da vida. Foi por rever meus processos assim como outros adolescentes e educadores que colaboravam com as atividades que percebi que essa também era minha causa e estou aí até hoje.
Campanha ANA: No ano de 2016 foi divulgado o balanço do disque direitos humanos nacional, onde pela primeira vez em muitos anos do serviço aparece na categoria de violências sexual contra crianças e adolescentes a questão da orientação sexual. Como você avalia isso?
Danielle Sanchez Mutaledi: Avalio como muita positividade a questão dados da orientação sexual,
entendo que várias crianças e adolescentes são vítimas de violências por sua orientação. Nesse processo de trabalhar com a questão da violência sexual, percebemos que tinha muitas denuncia relacionado os estrupo corretivos. No caso das meninas lésbicas as pessoas pensam que o fato de cometer o estrupo vão fazer que elas se tornem mulheres, como se ser lésbica a pessoas deixasse de ser mulher. E no caso o dos meninos, o estupro no sentido de “se você quer ser viado”, que é o termo que eles utilizam, ou vou te ensinar a ser e violam essas crianças e a adolescentes. Então quando se apresentam esses dados que traz a questão da orientação sexual, levanta-se essa preocupação de que meninas e meninos LGBTI no brasil hoje, tem mais probabilidade de sofrem violências, e precisamos trabalhar isso. E só vamos conseguir trabalhar se tivermos dados e diagnósticos que favoreça o levantamento destas situações. Por tanto trazer esses dados da orientação nas denúncias é fundamental para podermos evidenciar e trabalhar as questões da violência sexual.
Campanha ANA: Para você, qual a relação entre homofobia e a exploração sexual de crianças e adolescente?
Danielle Sanchez Mutaledi: Tem muito haver. Principalmente no sentido de que as mulheres trans no processo de exploração sexual elas se colocam muito mais vulneráveis. Isso também tem haver com a idealização do machismo que se dá também nessa perspectiva. Porque as pessoas se questionam como uma pessoa nasce em um corpo masculino e submete a se transforma num corpo feminino. Precisamos pensar também nessa interlocução entre homofobia e a violência sexual. Quando a gente pega por exemplo o casos de violência que estão relacionados as pessoas lgbt, o processo de exploração e violação é muito maior. Essa pessoas são submetidas a várias situações vexatória e humilhantes... Inclusive com as mulheres não trans. E com as mulheres trans essa situação se agrava muito mais. Se não conseguimos discutir a homofobia de forma clara, não vamos discutir de fato as nuances da exploração sexual. Até porque muitos entendem que as meninas e pessoas trans estão nessa situação por que querem. Mas na verdade, essa é a única alternativa que se apresenta, vinda de um processo de muita exclusão de todos os ambientes. E elas acabam se submetendo a essa situações muito degradante do que as pessoas heterossexuais ou que são binárias.
Campanha ANA: Você pontou anteriormente que há no imaginário que elas e eles estão em situação
de exploração sexual porque querem.... Você acredita que há um tratamento diferenciado no atendimento a crianças e adolescentes lgbti pela rede de proteção da infância? E si sim quais e por que dessas dificuldades?
Danielle Sanchez Mutaledi: Acredito que sim. Nós no Brasil vivemos um estado laico, mas muitos tem uma visão muito religiosa. E quando atendemos pessoas LGBTI você consegue perceber que em muitas instituições esse atendimento é diferenciado, por conta da orientação sexual. E é isso que temos que mudar. Pois a homofobia está nisso também. Se você não consegue atender as pessoas a partir das diretrizes que são passadas pelos conselhos de classe quanto pela questão ética mesmo do atendimento, isso gera uma situação muito complicada... Essas adolescentes no caso das trans, ou trans femininas, quando precisam ir para acolhimento institucional para acolhimento masculinos, pois os profissionais levam em consideração não a identidade de gênero e sim o sexo biológico. E isso é uma problemática. Nos caso dos meninos trans passam pelo mesmo problema, que levam para acolhimento feminino, e na cabeça desses profissionais eles estão protegendo essas meninas e meninos de qualquer situação de violência. Mas na verdade essa questão tem que ser trabalhada nas unidades de atendimento, pois você não precisa violar uma adolescente trans levando para um acolhimento institucional feminino porque acredita que está protegendo. Ou seja, nessa perspectiva de proteção a gente acaba violando o direitos dessa crianças e adolescentes.
Campanha ANA: Para você quais mediadas podem ser adotadas para que possa ser minimizadas esse tratamento diferenciado.
Danielle Sanchez Mutaledi: Precisamos é trabalhar na perspectiva mais humanista mesmo. Tirar a religião. Atender as crianças e adolescentes com suas especificidades, entendo que o brasil é diverso. Não adianta não vamos esconder a transsexualidade a lésbianidade, essas questões estão postas e cada uma e cada um vivencia sua sexualidade da maneira que quiser. O que a gente precisa é falar para nosso filhos, sobrinhos, amigos... Que Crianças e adolescentes tem sexualidade e que podem vivenciar de qualquer maneira, desde que seja de maneira saudável e respeitando a outra, o outro. E trabalhando nessa perspectiva que as pessoas são diversas, e a orientação sexual não vai fazer dela uma pessoa pior ou melhor que as outras. Não vai definir o caráter dessa pessoa e essa vivencia tem que ser respeitosa. A heterossexualidade precisa deixar de a normativa e compulsória. E toda vez que falamos de orientação sexual, muitos acreditam que estão fazendo apologia, mas o que precisa ser compreendido é a dimensão do respeito e do direito.
Campanha ANA: Há mais alguma questão que queria acrescentar?
Danielle Sanchez Mutaledi: Para finalizar quero ressalta sobre a importância da denúncia, e no caso de meninas e meninos LGBTi dizer dessa condição, pois precisamos construir dados para avançar na construção das políticas e instrumentalizar os nosso atendimento. Tanto no disque 100 como no conselho tutelar colocar as questões da orientação sexual e identidade de gênero, para que possamos trabalhar nesse panorama e conseguir efetivar a garantia dos diretos de crianças e adolescentes para todas e todos independe de identidade de gênero e religião.
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