segunda-feira, 31 de julho de 2017

Entrevista: Combater os sistemas opressores e o dia 25 de julho. Com Áurea Carolina

Fotos de Patrick Arley

Conversamos com Áurea Carolina de codinome Dejavu. Mulher negra, nascida em Tucuruí (PA), mas cresceu e se formou em Belo Horizonte. Sua trajetória de mobilização social começou nas ruas, em diálogo com o movimento hip hop e com diferentes iniciativas populares de promoção dos direitos humanos. É Cientista social, especialista em Gênero e Igualdade e mestre em Ciência Política. Foi subsecretária de Políticas para as Mulheres de Minas Gerais e é uma das fundadoras do Fórum das Juventudes da Grande BH. Atualmente, participa do movimento Muitas pela Cidade que Queremos e atualmente vereadora pelo Psol.
Na nossa conversa, ela conta um pouco de suas lutas e trajetória, e aponta a importância do dia 25 de julho. Confira abaixo.

Campanha ANA: Quem é Áurea Dejavu?

Áurea Carolina:  Áurea Dejavu era meu codinome quando eu cantava rap no grupo Dejavu, que integrei no início dos anos 2000, grupo que já existia. Eu entrei na segunda formação. Foi um grupo muito importante para minha atuação na cultura hip hop como artista ativista. Então esse era meu sobrenome como forma de identificação com essa cultura.

Campanha ANA: Quando foi que você se percebeu militante? E desde quando se tornou uma vivência efetiva na sua trajetória?

Áurea Carolina: Eu me reconheci como ativista política a partir da minha vivencia na cultura Hip-Hop... foi colando na rua nos evento e conhecendo parceiros do movimento Hip-Hop que eu me dei conta de uma dimensão maior de luta política. A arte que fazíamos de expressão periférica, tinha também um apelo de transformação social. E isso se consolidou na minha trajetória no momento em que me engajei no coletivo Hip-Hop chama. Eu cantava Rap no grupo Dejavu e pouco tempo depois eu entrei pro coletivo Hip-Hop chama que foi um espaço de discussão sobre direitos juvenis sobre gênero e sexual e redução de danos, e ali eu tive uma formação muito mais profunda, mais libertaria... Era um coletivo auto organizado de jovens da cultura hip-hop da região metropolitana de Belo Horizonte. E a gente tratava esses temas gênero, sexualidade e drogas numa perspectiva muito avançada. Discutíamos drogas a partir da ideia da redução de danos isso no ano 2000 e nos colocávamos de uma maneira muito avançada mesmo. E essa atuação foi abrindo caminhos para eu me engajar em outras lutas juvenis, movimento negro, feminista e pelo direito a cidade de forma ampla.

Campanha ANA: Áurea você foi a vereadora mais votada nas eleições de Belo Horizonte, no ano passado, com 17,4 mil votos. Você acredita que esse é um pedido da população de novo modo de fazer política e que leve em consideração as demandas sociais?

Áurea Carolina: A minha eleição como a veadora mais votada de Belo Horizonte em 2016 é um
marco sem dúvida, uma demonstração de força do nosso campo popular de resistência dos movimentos sociais... E assim um espaço a ser expandido, de correspondência institucional destas lutas em relação a nossa atuação de ponta, nos territórios com as diversas causas democráticas. Hoje existe uma distorção completa em relação ao peso populacional das maiorias sociais que são mulheres negras, jovens lgbts e trabalhadoras, somadas nós somos a grande parte desta sociedade. No entanto, nas instituições nós somos transformados em minoria políticas, quer dizer que, as verdadeiras minorias sociais que são grupos privilegiados, estão controlando as instituições como se fossem maioria, mas na realidade não são. Elas tem maioria pela lógica da regra da maioria dessa democracia formal, liberal. Mas buscando uma democracia real, intensa e de participação popular, esses grupos que formam a grande parte da sociedade precisam de ter uma entrada mais condizente como seu peso populacional. Vejo que minha eleição é uma sinalização desta demanda social. Além disso é um enfrentamento a onda de ataques conservadores e de ódio contra as conquista que nós a duras penas tivemos nos últimos anos em termos de direitos sociais e consolidação de algumas políticas públicas, mesmo com todas as dificuldades, então é um momento difícil no país e localmente isso também se expressa e a minha eleição é um ponto fora da curva, apesar de toda a nossa mobilização nos ainda não encontramos uma força real de revirada desse jogo , vamos precisar ainda construir mais capacidade política, de influência decisória nas eleições e nas instituições para promover justiça social.

Campanha ANA: A “Gabinetona” surge nessa perspectiva de inovação de fazer política no legislativo?

Áurea Carolina: A gabinetona é sim um espaço de inovação, de invenção política no legislativo de belo horizonte. O território de trabalho do nossos mandato coletivo que eu construo junto com a vereadora Cida Falabella e a Bella Gonçalves. Somos cerca de 40 pessoas na equipe da Gabinetona, trata-se um mantado integrado que nós construímos para muito além desse espaço de trabalho na Câmara. A Gabinetona é uma equipe disponibilizado integralmente para operacionalizar o mandato coletivo, popular e periférico que nós conquistamos. O mandato está nas comunidades, nos movimento sociais, com as diversas lutas em construção permanente. Temos criado espaço de participação como grupos fortalecedores temáticos, que discutem as diretrizes políticas do mandato. Como por exemplo um grupo que discute sobre a luta das trabalhadores nas ruas, camelôs e ambulantes, que tem sido fundamental para orientar nossa atuação contra a política higienista de retidas de camelôs e ambulantes do hiper centro de Belo Horizonte. Temos também um grupo fortalecedor das causas indígenas que tem sido muito importante para discussão da comunidade indígena e a possibilidade da criação de um centro de referência da população indígena, entre outros grupos fortalecedores nessa linha temática. São sempre espaço aberto a qualquer pessoa interessada e sobre tudo as pessoas que constroem efetivamente essas lutas no cotidiano. A Gabinetona então é esse lugar de busca de uma democracia horizontal em que toda equipe participe de igual para igual, onde sejamos solidárias e façamos a parti de uma convivência democrática e respeito ao nosso vínculos, que a gente cuide disso e que façamos uma política que desafie essa lógica de competição e opressão que geralmente acontecem nos espaços de poder.

Campanha ANA: Qual a importância do dia 25 de julho e quais as reivindicações o dia internacional traz para agenda pública?

Áurea Carolina: 
O dia 25 de julho que celebra o reconhecimento das mulheres Afrolatinas e Caribenha e no Brasil especificamente trazendo a memória Tereza da Benguela, uma líder quilombola... É um momento de afirmação da nossa resistência cotidiana e de denuncia das violência que sofremos a séculos. Por esse estado genocida colonial que produz o tempo inteiro desigualdade e exclusão de nos mulheres negras, das mulheres latinas da ´possibilidade da cidadania plena. É muito importante trazer essa data como símbolo de resistência e denúncia.

Campanha ANA: A violência nas sociedades afetadas pelo racismo patriarcal heteronormativo atinge de maneira desproporcional as populações negras, com forte marca do sexismo e das fobias LGBT. Diante de todo esse cenário, o que podemos fazer ou mesmo enfatizar enquanto indivíduos e instituições para enfrentar mazelas?

Áurea Carolina: Nós vivemos tempos muito difíceis de acirramentos de condutadas e discursos de ódio, e isso se volta sobre tudo contra as mulheres, a população negra, lgbt, indígenas e as juventude periféricas... É preciso então buscar e construir outras formas de conivências. Investir muito em
processo de educação popular, de formação coletiva e de mobilização nos territórios para que a gente numa perspectiva de poder popular se coloque em contra posição a mídia tradicional antidemocrática, as instituições políticas que não nos contemplam, ao próprio mercado. Ao capitalista que é um verto permanente de opressão. É preciso discutir na cultura, na educação como ter uma sociedade mais inclusiva. Não é à toa que esses grupos conservadores são contrários as discussão de gênero, sexualidade e igualdade racial por exemplo. Eles sabem que quando uma pessoas começa a refletir criticamente, ela passa a contestar o poder de grupos e instituições que querem controlar a nossa vida sexual, a nossa forma de existência. Então esses grupos querem minar essas possibilidades da reflexão crítica na origem. Querem que crianças e adolescentes não tenham acesso a esses debate, porque essa é uma maneira de continuar exercendo o poder de dominação sobre a população em geral. Por isso precisamos de muita atenção, cuidar muito dos nosso processo de lutas e desenvolver ações cada vez mais abrangentes com os coletivos e as comunidades na ponta mesmo. Precisamos ocupar as instituições de poder e ao mesmo tempo desenvolver nossa atuação autônoma com as lutas sociais. Sem esse processo autônomo de pensamento crítico e de invenção de novas práticas, a gente não vai ter sucesso na ocupação institucional, até porque a ocupação institucional não é um fim em si, mas um meio para fortalecer as nossa lutas e conquistar direitos.

Campanha ANA: Como as organizações que atendem crianças e adolescentes podem contribuir com as pautas das mulheres negras, latinas e caribenhas?

Áurea Carolina: Penso que as organizações que atua e defendem com prioridade os direitos de meninas e meninos, devem desenvolver as temáticas de gênero e de raça de forma interseccional, no enfrentamento as desigualdades, por que as crianças e adolescentes são corporificados. Existem numa sociedade que é estruturada a partir das desigualdades de raça e de gênero. Evidentemente que tudo isso é atravessado desigualdades socioeconômicas... então como é que poderemos avançar na inclusão de crianças e adolescentes na sua proteção integral sem trazer essas condicionantes da realidade social Brasileira de gênero e raça. Nós vivemos num país que se fundou a partir do racismos, da exploração econômica e do estrupo e da violência contra as mulheres. Poder trabalhar em processo educativos em processo de mobilização com crianças e adolescentes nessa perspectiva é uma contribuição fundamental para questionamento dessas desigualdades, e também para formação de gerações mais comprometidas com a democracia, com o respeito as todas as pessoas e também para que sejam crianças mais felizes e mais livres... Que possam vivenciar a sua sexualidade e identidade de gênero com muita tranquilidade, de forma saudável sem sofrem cerceamento. Então eu penso que deve ser um compromisso adotado pelas organizações de trazer esse debate como um eixo fundamental de ação política.





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